O Pr. Gilson Soares dos Santos é casado com a Missionária Selma Santos, tendo três filhos: Micaelle, Álef e Michelle. É servo do Senhor Jesus Cristo, chamado com santa vocação. Bacharel em Teologia pelo STEC (Seminário Teológico Evangélico Congregacional), Campina Grande/PB; Graduado em Filosofia pela UEPB (Universidade Estadual da Paraíba); Pós-Graduando em Teologia Bíblica pelo CPAJ/Mackenzie (Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper). Professor de Filosofia e Teologia Sistemática no STEC. Professor de Teologia Sistemática no STEMES, em Campina Grande - Paraíba. Pastor do Quadro de Ministros da Aliança das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil (AIECB). Pastoreou a Igreja Evangélica Congregacional de Cuité/PB, durante 15 anos (1993-2008). Atualmente é Pastor Titular da Igreja Evangélica Congregacional em Areia - Paraíba.

15 de janeiro de 2013

Conservadores e Radicais: Uma polarização desnecessária na igreja contemporânea


CONSERVADORES E RADICAIS: UMA POLARIZAÇÃO DESNECESSÁRIA NA IGREJA CONTEMPORÂNEA

Pr. Gilson Soares dos Santos

John Stott (1921-2011) posicionou-se contra a polarização existente na igreja contemporânea, ou seja, o extremismo ou desequilíbrio encontrado na igreja de hoje. Para ele, a polarização é uma das grandes tragédias da cristandade moderna. Nós nos separamos uns dos outros por assuntos considerados tão banais, isso causa desequilíbrio. Por isso, em sua obra Cristianismo equilibrado, Stott apresenta a necessidade de um equilíbrio. Propomo-nos destacar o equilíbrio apresentado por ele para a questão entre conservadorismo e radicalismo, quando defende que cada crente deveria ser conservador e radical ao mesmo tempo.

De início, Stott apresenta o que pode ser entendido como uma pessoa conservadora e uma pessoa radical. Uma pessoa conservadora é aquela que está determinada a conservar ou preservar o passado, sendo, portanto, resistente a mudanças. Uma pessoa radical deve ser entendida como aquela que está em rebelião contra o que é herdado do passado e, por isso, teima em fazer agitações por mudanças. Para Stott é preciso que cada cristão seja conservador, e, ao mesmo tempo, radical.

Cada crente dever ser um conservador porque fomos chamados para “guardar o depósito” (I Tm 6.20; II Tm 1.14), fomos chamados a batalhar “pela fé que uma vez foi dada aos santos” (Jd 1.3). A igreja precisa ser conservadora quanto ao Evangelho. Sua tarefa, segundo Stott, não é inventar novos evangelhos, novas teologias e novos cristianismos. Porém, é sua tarefa ser a guardiã fiel do único Evangelho eterno. Isso não implica em uma resistência cega ao pensamento novo. Ser conservacionista não é ser antiquário e obscurantista, pois antiquarianismo e obscurantismo são vícios da mente dos crentes, mas conservadorismo está entre as suas virtudes.

No entanto, alguns crentes erram porque seu conservadorismo não está ligado à preservação do Evangelho fiel, nem à teologia que professam, tais pessoas são conservadoras por natureza. Segundo Stott “são  conservadores na política e na perspectiva social, no estilo de vida, no estilo  de vestir, no estilo de cortar o cabelo, no estilo da barba, em qualquer outro  tipo de estilo que se mencione”. Mudança de qualquer tipo é anátema para esse tipo de crente. Como citado por Stott “Qualquer mudança , em qualquer tempo e  por qualquer razão, deve ser deplorada!”.

Por outro lado, segundo Stott, cada crente dever ser radical e fazer perguntas sobre as tradições herdadas, a fim de evitar adoração à “vaca sagrada”, estando preparado para submeter qualquer coisa herdada do passado ao escrutínio crítico. Esse juízo crítico o leva a ansiar por reformas. E até mesmo as inicia. O crente radical consegue fazer uma leitura do mundo e perceber que a cena está mudando hoje. A chegada prematura do futuro, é claro, não o ameaça nem o choca, pois ele sabe que mudanças são inevitáveis, por isso se ajusta para dar-lhe as boas vindas.

É possível ser conservador e radical ao mesmo tempo? Stott toma Cristo como exemplo de alguém que foi conciliatoriamente um conservador e radical ao mesmo tempo, em esferas diferentes, é claro. Jesus foi um conservador no que tange às Sagradas Escrituras. Ele atacou os religiosos de sua época que desrespeitavam as Escrituras, e deixou bem claro que as Escrituras não poderiam ser mudadas. Seu conservadorismo sobre as Escrituras fica claro em sua afirmação “Nem um jota nem um til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido” (Jo 10.17 e Mt 5.17,18). De acordo com Stott, Jesus também demonstra radicalismo quando, por exemplo, critica o tradicionalismo judeu, que conservava as tradições humanas em detrimento das Escrituras. Ele lançou fora séculos de tradições humanas, a “tradição dos anciãos”, a fim de que o povo se voltasse para a Palavra. Jesus também foi ousado em quebrar as convenções sociais: falou com mulheres em público, deu atenção às crianças, permitiu que prostitutas o tocasse, tocou num leproso, recusou ser preso aos costumes humanos. Sua mente estava ligada unicamente à Palavra, jamais às tradições humanas. “Jesus foi uma combinação única entre o conservador e o radical: conservador em relação às Escrituras, e radical no seu escrutínio (seu escrutínio bíblico) de todas as outras coisas”.

Stott recorre às palavras de Leighton Ford: “Deus não está preso ao inglês do século dezessete, nem aos hinos do século dezoito, nem à arquitetura do século dezenove, nem aos clichês do século vinte”. Deus não muda, sua revelação não muda, mas chama seu povo para novos, e venturosos, empreendimentos. É preciso discernir entre Escritura e cultura. As Escrituras são imutáveis, porque são a Palavra de Deus. A cultura é mutável, pois é uma mistura de tradição eclesiástica, convenção social e criatividade artística. Cultura muda de época para época, de lugar para lugar. Precisamos submeter nossa cultura a um escrutínio bíblico constante. “O formato e a decoração dos nossos templos, nossos métodos pastorais e evangelísticos, e tudo o que fazemos como igreja. Tudo isto deve ser submetido à investigação bíblica regular e crítica." A resistência a mudanças somente deve acontecer quando estivermos defendendo as Sagradas Escrituras.

É possivel perceber que Stott nos chama ao equilíbrio. Devemos conservar as Escrituras, mas precisamos clamar por mudanças, e estas mudanças não podem ser rebelião contra a Palavra de Deus, mas sim contra as tradições humanas, as quais os homens querem colocar em pé de igualdade com as Escrituras Sagradas. Nossa tradição não pode, nem deve, ser revestida de autoridade semelhante à Bíblia. Devemos resistir a toda e qualquer mudança que confronte o texto sagrado, mas devemos estar abertos ao diálogo com as mudanças que nos ajudam a fugir da idolatria à “vaca sagrada”. Sejamos, no dizer de Stott, conservadores quanto à Palavra e radicais quanto às tradições herdadas, estando abertos às mudanças, desde que elas não contrariem as Sagradas Escrituras.