CONSIDERAÇÕES
NECESSÁRIAS SOBRE O “APELO” PARA CONVERSÕES – PARTE I
Atos 2.37-41
Pr. Gilson Soares dos Santos
INTRODUÇÃO
É comum, na maioria das igrejas
evangélicas, a prática de convidar as pessoas para virem à frente comprovando
que estão tomando uma decisão por Cristo Jesus, após ouvirem a pregação da
Palavra. Essa prática é comumente chamada de apelo.
Várias expressões são utilizadas nessa
convocação: “vir à frente”, “vir ao altar”, “momento de conversão”, “entregar a
vida a Jesus”, etc.
Este é um assunto que tem ganhado
proeminência porque pregadores que não fazem “apelo” têm sido censurados pelas
pessoas. Por outro lado, pregadores que fazem “apelo” são acusados de estar
“forçando a barra”.
Sobre isto trataremos neste estudo.
I_ APELO PARA DECISÕES: AS ORIGENS DESSA
PRÁTICA
Comecemos analisando, historicamente,
quando começou a prática de convidar pessoas à frente para aceitarem a Cristo
como Salvador.
1.1_ Charles Finney e o assento dos ansiosos
A prática de convocar as pessoas para
virem à frente aceitando a Cristo tem seu início com Charles Finney. Ele achava
de grande importância que as pessoas tomassem uma posição perante Deus, após
ouvirem a pregação do Evangelho.
Quem nos ajudará a compreender a origem
dessa prática em Charles Finney, é o pastor congregacional D. M. Lloyd-Jones,
no seu livro Pregação e Pregadores,
na parte que trata sobre apelando por
decisões. Leiamos o que ele escreve:
Esse costume foi introduzido bastante cedo no
século passado, mais cedo que outras coisas que tenho mencionado. Realmente foi
introduzido por Charles G. Finney na década de 1820. Foi ele quem deu início ao
chamado “assento dos ansiosos”, aquela “nova medida” através da qual se apelava
às pessoas que se decidissem no mesmo instante. Tudo fazia parte essencial de
seu método, abordagem e maneira de pensar; e naqueles dias a questão provocou
muitas controvérsias. (1). – Lloyd-Jones
Ainda podemos encontrar na Teologia Sistemática de Franklin
Ferreira e Allan Myatt um pouco dessa história.
Reagindo contra o calvinismo, que predominava
na teologia americana nos séculos XVII e XVIII, Charles Finney mudou a ênfase
da pregação doutrinária para uma ênfase em fazer com que as pessoas “tomassem
uma decisão”, ou que fizessem uma escolha de seguir a Cristo. (2). – Franklin Ferreira
1.2_ Uma prática que virou regra
Com o passar do tempo, a prática de
convidar pessoas para virem à frente, entregando a vida a Jesus, virou regra.
O uso desse auxílio para aumentar o número
de conversos foi propagado e tornou-se obrigatório, pois muitos ministérios bem
sucedidos (em números) a utilizaram, a exemplo do Ministério de Billy Graham.
Muitos pregadores são cobrados quando não
usam desse recurso. Um pregador que manifesta seu descontentamento com as
cobranças que lhe foram feitas é o pregador David Martin Lloyd-Jones:
Algumas pessoas, em diversas ocasiões, ao
encerrar-se alguma reunião, têm-se aproximado de mim a fim de me chamarem a
atenção, passando-me às vezes uma verdadeira reprimenda, porque eu não fizera
um apelo imediato para que as pessoas se decidissem. Algumas dessas pessoas
chegam mesmo ao extremo de afirmar que com isso eu cometo um pecado, que fora
criada uma oportunidade excelente pela minha própria pregação, mas eu não me
aproveitara da mesma. E então costumam dizer: “Tenho certeza de que se o senhor
ao menos tivesse feito um apelo, teria conseguido um grande número de decisões”
— ou algo similar a esse argumento. (3).
– Lloyd-Jones
Ele comenta que outros pastores haviam
sofrido a mesma reprimenda:
Em adição a isso, certo número de ministros
me tem dito, nos últimos dez anos mais ou menos, que no fim do culto certas
pessoas vêm dizer-lhes que eles não pregaram o Evangelho, simplesmente por não
terem feito um apelo. Isso lhes havia acontecido tanto em cultos matinais como
em cultos noturnos. E já havia sucedido não somente durante cultos de
evangelização, mas igualmente em outras reuniões, cujo intuito não é
primariamente evangelístico. Não obstante, por não ter havido qualquer “apelo”,
haviam sido acusados de não terem pregado o Evangelho. De certa feita conheci
três homens, três pastores, que virtualmente já tinham sido contratados para
pastorear em determinadas Igrejas, e que estavam a ponto de serem aceitos
quando alguém, de repente, lhes fizera a pergunta: Eles costumavam fazer um “apelo”
no fim de cada sermão? E posto que aqueles três homens em particular haviam
respondido na negativa, não foram aceitos, afinal, ficando cancelada a decisão
daquelas Igrejas. (4). – Lloyd-Jones
II_ AS DECISÕES NAS ESCRITURAS
É bom recorrermos às Escrituras,
principalmente no Novo Testamento, para contemplarmos como as decisões
aconteciam.
2.1_ Zaqueu levantou-se e tomou a iniciativa
(Lc 19.1-10)
Versículos destacados: “8 Entrementes, Zaqueu se
levantou e disse ao Senhor: Senhor, resolvo dar aos pobres a metade dos meus
bens; e, se nalguma coisa tenho defraudado alguém, restituo quatro vezes mais.
9 Então, Jesus lhe disse: Hoje, houve salvação nesta casa, pois que também este
é filho de Abraão.” (Lc 19.8,9).
Zaqueu não
se tornou salvo porque resolveu restituir a quem tinha defraudado, tampouco
tornou-se salvo por haver decidido dar metade da sua riqueza aos pobres. Ele
tomou essas decisões porque dentro dele foi gerada a salvação. Obras de
natureza prática seguiram-se à alegria da salvação.
Veja que a iniciativa partiu de Zaqueu,
após ter surgido nele a nova vida. Jesus não o forçou a tomar decisão, porque
isso tem que nascer de dentro para fora.
2.2_ O ladrão na cruz, arrependido, tomou a
iniciativa (Lc 23.39-43)
Versículos destacados: “42 E acrescentou:
Jesus, lembra-te de mim quando vieres no teu reino. 43 Jesus lhe respondeu: Em
verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso.” (Lc 23.42,43). (ARA).
O ladrão arrependido toma a iniciativa de
fazer um pedido a Jesus. Sua atitude revela que algo já havia acontecido dentro
dele. Não foi uma imposição de fora para dentro, mas uma decisão de dentro para
fora.
Sua fé era tanta que acreditou num rei
moribundo, que estava morrendo da mesma forma que ele. Porém o novo nascimento
faz a pessoa crer mesmo quando tudo em volta parece perdido.
Quando isto acontece, a pessoa toma a
iniciativa e confessa a sua crença, pois o Evangelho é o poder de Deus.
2.3_ Em Atos 2, após a pregação de Pedro, as
pessoas tomaram a iniciativa (At 2.37-41)
Versículos destacados: “37 Ouvindo eles estas
coisas, compungiu-se-lhes o coração e perguntaram a Pedro e aos demais
apóstolos: Que faremos, irmãos? 38 Respondeu-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada
um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos
pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo.” (At 2.37,38). (ARA).
Os ouvintes de Pedro tomaram estas palavras
como referência pessoal a eles. Muitos deles, talvez, tinham tacitamente
concordado com o ato dos seus líderes ao matarem a Jesus. A revelação que Pedro
lhes fizera da posição e da dignidade de Jesus chegou a eles como choque
drástico, e compungiu-se-lhes o
coração com aquilo que se lhes dissera.(5)
Veja que, tocados pela Palavra, entendendo
a condição de pecadores na qual se encontravam os ouvintes tomam a iniciativa e
pergunta que faremos irmãos?
2.4_ O carcereiro tomou a iniciativa por meio
de uma pergunta (At 16.29-32)
Versículos destacados: “30 Depois, trazendo-os
para fora, disse: Senhores, que devo fazer para que seja salvo? 31
Responderam-lhe: Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua casa.” (At
16.30,31). (ARA)
2.5_ Quando Paulo pregou no Areópago, não
fica especificado como as pessoas se agregaram (At 17.32-34
Versículo destacado: “34 Houve, porém,
alguns homens que se agregaram a ele e creram; entre eles estava Dionísio, o
areopagita, uma mulher chamada Dâmaris e, com eles, outros mais.” (At 17.34).
(ARA)
CONCLUSÃO
Nessa primeira parte de nosso estudo sobre
a prática do apelo, aprendemos a origem dessa prática, vimos o quanto ela
tornou-se quase uma obrigação após a pregação, e ainda vimos como as conversões
aconteciam nos tempos do Novo Testamento.
BIBLIOGRAFIA
(1)_(3)_(4)_ LLOYD-JONES, David Martin. Pregação e Pregadores. São José dos Campos: Fiel. 1998. P114.
(2)_ FERREIRA,
Franklin. MYATT, Alan. Teologia
Sistemática. Uma Análise histórica,
bíblica e apologética para o contexto atual. São Paulo: Vida Nova. 2007.
P782.
(5)_ MARSHALL, I.
Howard. Atos: Introdução e Comentário.
São Paulo: Edições Vida Nova. 1982. P80.