EVANGÉLICOS COM ALMA CATÓLICA
Pr.
Gilson Soares dos Santos
Dia 08 de Dezembro de 2014, trânsito congestionado na
pequena cidade de Areia, na Paraíba: motos, ônibus, carros de passeio,
caminhões-pipa, carros de transporte alternativo e pedestres. Motivo? Festa da
padroeira da cidade, denominada senhora da conceição. Fiquei observando da
varanda do apartamento onde moro a correria, o stress dos motoristas, a
tentativa de alguns no propósito de “desatar o nó” que havia se formado no
trânsito. Fiquei por algum tempo pensando sobre os eventos católicos, suas
conquistas, seus dias feriados no calendário. Mas também fiquei pensando na
grande influência dessa religião sobre a nação brasileira. Meu pensamento
continuou no dia seguinte. Resolvi fazer uma leitura em um livro evangélico, O que
estão fazendo com a igreja, de autoria do Pr. Augustus Nicodemus Lopes.
Nesse livro, no capítulo dois, que traz o título “A alma católica dos evangélicos no Brasil”, o reverendo trata
dessa influência católica na nação brasileira, especificamente sobre muitos que
se declaram evangélicos. Resolvi postar uma síntese sobre como Nicodemus trata
o tema.
Para Nicodemus (2008, p.25), “os evangélicos
nunca conseguiram se despir totalmente da influência do catolicismo romano.”,
isto, obviamente, explica a crise pela qual a igreja evangélica brasileira se
encontra. Isso não quer dizer, segundo o autor, que não tenha acontecido o novo
nascimento no evangélico, pois, “Alguém
pode ter sido regenerado pelo Espírito e ainda continuar, por um tempo, a
enxergar as coisas com os pressupostos antigos.” (LOPES, 2008, p.25). Ele elenca
algumas heranças católicas que teimam em estar na alma evangélica brasileira:
1 – O gosto por bispos e apóstolos
Os
brasileiros, seguindo o sistema papal, têm gosto por bispos, catedrais, pompas
e rituais. Os evangélicos tendem para o mesmo, por isso é fácil aceitar bispos
e apóstolos que se autonomearam assim. Infelizmente, “A doutrina reformada do
sacerdócio universal dos crentes e a abolição da distinção entre clérigos e leigos ainda não permearam a cosmovisão
dos evangélicos no Brasil, com poucas exceções.” (idem, p, 26).
Mesmo encontrando nas Escrituras que um dos
requisitos para o apostolado é ser testemunha da ressurreição de Cristo (Atos
1.21-22); mesmo sabendo que todos os apóstolos viram o Cristo ressurreto,
inclusive Paulo, (I Co 15.5-8); mesmo sendo orientados que o cristianismo
histórico sempre entendeu que Paulo foi o último dos apóstolos; muitos chamados
evangélicos brasileiros aceitam em seu meio pessoas que se autodeclaram
apóstolos.
2 – A ideia
de que pastores são mediadores entre Deus e os homens
“No catolicismo, a igreja e mediadora entre Deus e os homens
e transmite a graça divina mediante os sacramentos, as indulgencias. as orações.
É através dos sacerdotes católicos que essa graça é concedida, pois são eles
que, com suas palavras, transformam na missa o pão e o vinho no corpo e no
sangue de Cristo; que aplicam a agua benta no batismo para remissão de pecados;
que ouvem a confissão do povo e pronunciam o perdão. Em alguns casos, o padre é
visto como "outro Cristo", um canal de mediação entre o rebanho
e Deus.” (idem, p.27).
Os
evangélicos assimilaram essa tendência católica com poucas alterações. Basta
ver que muitos só acreditam na oração do pastor, de preferência com imposição
das mãos. O neopentecostalismo tem explorado esse ranço católico, fazendo o
fiel acreditar que a oração do “obreiro”, do “bispo” ou do “apóstolo” é mais
poderosa do que a oração dos demais crentes.
3 – O misticismo supersticioso no apego a
objetos sagrados
“O catolicismo no Brasil, por sua vez influenciado pelas
religiões afrobrasileiras, semeou misticismo e superstição durante séculos na
alma nacional, enaltecendo milagres de santos, posse de relíquias, aparições de Cristo e de Maria, unção e santificação de objetos, água benta, entre muitos outros.” (ibidem, p.28).
Quem disse
que muitas igrejas que se declaram evangélicas não têm feito o mesmo? Copo d’água
fluidificada, rosa ungida, sal grosso, pulseiras abençoadas, galhos de arruda,
pentes santos do kit de beleza da Rainha Ester, oração nos montes, óleos
ungidos, água do Jordão, cajado de Moisés, patuás, amuletos, dentes de alho,
martelinho da prosperidade, toalha do ‘apóstolo’, etc. Toda essa herança
católica está na alma de muitos evangélicos.
4 – A separação entre sagrado e profano
Para o
católico, sagrado é tudo aquilo que substanciado na Santa Igreja. Tudo aquilo
que a gente vai fazer na igreja é sagrado. Tudo o que acontecer fora disso é
profano. Nesse sentido, trabalho, estudos, as ciências, tudo é profano.
“Hoje, os evangélicos parecem partilhar a mesma visão.
Falta-nos uma mentalidade que integre a fé às demais áreas da vida, conforme a visão bíblica de que tudo é sagrado. Por exemplo, na área
da educação,
temos por séculos deixado que a mentalidade
humanista secularizada, permeada de pressupostos anticristãos,
eduque nossos filhos, do ensino fundamental ate o superior.” (Idem, p.29).
Uma coisa
deve ficar clara: o autor não está defendendo que devemos aliar as coisas
pecaminosas às coisas de Deus, no propósito de acabar com a dicotomia sagrado/profano.
O problema é que muitos evangélicos demonizam tudo aquilo que não está subjugado
à igreja. Segundo a Bíblia, não há, para o verdadeiro cristão, uma separação
entre sagrado e secular, pois pertencemos a Cristo em tudo o que fazemos na
igreja ou fora dela, porém o cristão deve manter-se longe do pecado e das
corrupções do mundo.
5 – Somente pecados sexuais são realmente
graves
No catolicismo,
os pecados punidos são aqueles relacionados à área sexual.
“Nas igrejas evangélicas - onde se sabe que, segundo a Bíblia,
todo pecado é odioso e que quem guarda toda a lei de Deus e quebra urn só mandamento
e culpado de todos - é raro que alguém seja disciplinado, corrigido, admoestado,
destituído ou despojado por pecados como mentira, preguiça, orgulho, vaidade, maledicência, entre outros. As disciplinas
eclesiásticas objetivam, via de regra, pecados de natureza sexual, como
adultério, prostituição, fornicação.”
(Idem, p.30).
O Pr. Augustus Nicodemus (idem, p.31), conclui o capítulo dois da
seguinte forma:
‘Um dos efeitos mais destrutivos dessa mentalidade
romanista e que
pavimentou em vários aspectos o caminho para a entrada do
liberalismo teológico no cenário evangélico. Pois o ponto central dessa mentalidade
e, em ultima analise, o enfraquecimento das Escrituras como a Palavra de Deus, a
única regra de fé e prática. A autoridade e a mediação dos bispos e
apóstolos, o uso de objetos ungidos como pontos onde a fé se apoia, a ênfase em
determinados pecados em detrimento de outros igualmente condenados na Bíblia serviram
para enfraquecer a autoridade das Escrituras dentro do evangelicalismo. Assim,
o catolicismo preparou os evangélicos para aceitarem outra fonte de autoridade
além da Bíblia. Nesse contexto, a tarefa dos liberais, de desacreditá-la sutilmente
como a infalível e autoritativa Palavra inspirada de Deus, tornou-se muito mais
fácil, relativizando seu sentido e expurgando-a de seu caráter normativo.”
E aqui concluímos
essa postagem que chama a atenção para a necessidade urgente de a igreja
evangélica brasileira desvencilhar-se do ranço católico romano. Não para que
sejamos anticatólicos, mas para que sejamos bíblicos, cada vez mais bíblicos.
BIBLIOGRAFIA
LOPES,
Augustus Nicodemus. O que estão fazendo
com a igreja: ascensão e queda do
movimento evangélico brasileiro. São Paulo: Mundo Cristão. 2008.