UM PEQUENO ESTUDO SOBRE O PRINCÍPIO REGULADOR DO CULTO
Pr.
Gilson Soares dos Santos
Texto
Bíblico Básico: Salmo
150
“1
Aleluia! Louvai a Deus no seu santuário; louvai-o no firmamento, obra do seu
poder. 2 Louvai-o pelos seus poderosos feitos; louvai-o consoante a sua muita
grandeza. 3 Louvai-o ao som da trombeta; louvai-o com saltério e com harpa. 4
Louvai-o com adufes e danças; louvai-o com instrumentos de cordas e com
flautas. 5 Louvai-o com címbalos sonoros; louvai-o com címbalos retumbantes. 6
Todo ser que respira louve ao SENHOR. Aleluia!” (Sl 150).
INTRODUÇÃO
O
Princípio Regulador do Culto tem sido motivo de controvérsias entre o povo de
Deus. Uns tem abraçado com muita alegria, outros o contestam. Para uns, ele é
um instrumento necessário para regular os atos do culto prestado a Deus. Para
outros, ele “engessa” a adoração da igreja. Enquanto uns veem nele uma maneira
de nortear a igreja para o verdadeiro culto, outros o acham excessivamente
prescritivo.
O
que é o Princípio Regulador do Culto? Onde se originou? Quando recebeu sua
forma clássica e definitiva? Quais os “prós” e os “contras”? Por que gera tanta
contestação?
Nossa lição de hoje buscará respostas para estas, e outras, perguntas
sobre o Princípio Regulador do Culto.
I_ O
PRINCÍPIO REGULADOR DO CULTO: DEFINIÇÃO
O
que é o Princípio Regulador do Culto?
Vejamos:
É
o princípio que afirma que o culto público deve ser bíblico. O que não for
diretamente ensinado nas Escrituras, ou necessariamente inferido do seu ensino,
é proibido no culto.
Em
síntese o Princípio Regulador do Culto afirma que só é permitido no culto
aquilo que tiver real fundamentação bíblica. Sendo assim, o Princípio condena a
imposição de cerimônias, festividades religiosas, gestos e símbolos não
fundamentados nas Escrituras.
II_ O
PRINCÍPIO REGULADOR DO CULTO: SUAS ORIGENS
O
Princípio Regulador do Culto tem início com os Reformadores Puritanos.
Vejamos
suas origens.
2.1_
Origem em Calvino
No
ano de 1543, Calvino escreveu um tratado chamado de “A necessidade de reformar a igreja”, escrevendo o seguinte:
“A regra que
distingue entre o culto puro e o culto corrompido é de aplicação universal, a
fim de que não adotemos nenhum artifício que nos pareça apropriado, mas
atentemos para as instruções do Único que está autorizado a legislar quanto ao
assunto. Portanto, se quisermos que Ele (Deus) aprove o nosso culto, esta
regra, que Ele impõe nas Escrituras com o máximo rigor, deve ser cuidadosamente
observada.” (João Calvino) (1)
O
que encontramos no tratado de Calvino?
·
A
regra que faz distinção entre o culto verdadeiro e o culto falso tem aplicação
universal, ou seja, é para todos.
·
Só
existe uma pessoa que pode legislar, ou seja, estabelecer normas para o culto,
essa pessoa é Deus.
·
E
a regra para o culto Deus já impõe nas Escrituras, devendo ser observada com o
máximo rigor.
Calvino afirmou claramente este Princípio Regulador e o aplicou
consistentemente na Reforma em Genebra.
Para Calvino, o Princípio Regulador do Culto pode ser encontrado no
segundo mandamento do Decálogo. Sobre isto ele (Calvino) escreve:
“Assim como no
primeiro mandamento o Senhor declara que é o único Deus, e que além dEle não se
deve adorar ou imaginar outros deuses, do mesmo modo Ele aqui explica mais
claramente qual é a Sua natureza e por qual tipo de adoração deve ser honrado,
para que não nos atrevamos a imagina-Lo como algo carnal. O teor do mandamento
é, portanto, que Ele não permite que o Seu culto legítimo seja profanado com
ritos supersticiosos.” (João Calvino)
(2).
2.2_
Origem em John Owen (1616-1683)
John Owen, ministro congregacional puritano, também escreveu sobre o
culto:
A invenção arbitrária
de qualquer coisa imposta como necessária e indispensável no culto público a
Deus, como parte desse culto, e o uso de qualquer coisa inventada e ordenada no
culto é ilegal e contrário à regra da Palavra... Portanto, todo o dever da Igreja
com relação ao culto a Deus, parece consistir na precisa observação daquilo que
é prescrito e ordenado por Ele (Deus). – (John Owen) (3)
O
que Owen nos diz?
·
Ninguém
pode inventar coisas arbitrárias no
culto público a Deus.
·
Qualquer
coisa inventada e ordenada no culto é ilegal e contrário à Bíblia.
·
O
dever da igreja, no culto à Deus, é observar o que está prescrito por Ele em
Sua Palavra.
2.3_ Origem na Confissão de Fé de Westminster
“Emana do Capítulo XXI da Confissão de Fé de
Westminster, o que convencionou-se chamar de Princípio Regulador do Culto.”
(4) (Marcos Granconato).
O que conhecemos hoje como
Princípio Regulador do Culto é encontrado, de maneira sistematizada, no
Capítulo XXI da Confissão de Fé de Westminster. É reproduzido em outras
Confissões de Fé e, recentemente, na Confissão de Fé da Aliança das Igrejas
Evangélicas Congregacionais do Brasil, no Capítulo XXIII, que trata Do Culto
Religioso e do Dia de Repouso. Vamos reproduzir o texto na íntegra:
“I_ Cremos e confessamos que a luz da natureza revela a existência
de um Deus que mantém o senhorio e soberania sobre tudo; que é justo é bom e
faz o bem a todos; portanto, Ele deve ser temido, amado, louvado, invocado,
crido e servido de todo o coração, de toda a alma e todas as forças (Dt 6.4-9; Rm 1.20; At 14.17; At 17.24-25).
Mas a forma aceitável de cultuar o Deus verdadeiro é instituída por Ele mesmo
e, portanto, delimitada por sua própria vontade revelada, (Ex 20.4-6; Dt 12.32;
Jo 4.20-24). de modo que Ele não pode ser cultuado segundo as imaginações e
invenções humanas, (Mt 15.7-9) nem segundo as sugestões de Satanás, sob alguma
representação visível, ou por qualquer outra forma não prescrita na Sagrada
Escritura. (Ex 20.4-6; Mt 4.10).
II_ O culto religioso deve ser oferecido a Deus o Pai, Filho
e Espírito Santo, e a Ele só (Mt 4.10; Jo 5.23; II Co 13.13); não a anjos, nem
a santos, nem a qualquer outra criatura (Rm 1.25; Cl 2.18; Ap 19.10); e, desde
a queda, não pode ser oferecido sem um mediador, nem pode ser pela mediação de
algum outro, senão exclusivamente de Cristo (Jo 14.6; Ef 2.1,18; Cl 3.17; I Tm
2.5).” (5) – (Confissão Congregacional)
O
que nos traz a Confissão?
·
Deus
deve ser temido, amado, louvado, invocado, crido e servido de todo coração, de
toda a alma e de todas as forças..
·
A
forma de cultuar a Deus foi instituída por Ele mesmo, é claro, em Sua palavra.
·
Isso
descarta qualquer adoração que venha da imaginação humana, da tentação de
Satanás ou de qualquer outra maneira que não esteja na Sagrada Escritura.
III_ O PRINCÍPIO REGULADOR
DO CULTO VERSUS O PRINCÍPIO NORMATIVO
Existem duas linhas de
pensamentos a respeito do culto. Elas se opõem. E tem sido o motivo de
controvérsias, tanto em tempos antigos como hoje em dia.
3.1_ O Princípio Normativo
Este Princípio apresentado
pelo romanismo e anglicanismo afirmava que “O que não for diretamente proibido
nas Escrituras é permitido no culto” (5).
Esse Princípio defendia a inclusão de qualquer prática, símbolos,
cerimônias, que não é ordenada nem proibida nas Escrituras.
Samuel Parker, defensor desse
princípio, escreveu:
“Aquilo que as Escrituras não proíbem,
elas permitem; e o que permitem não é ilegal; e o que não é ilegal pode ser
feito legalmente.” (Samuel Parker) (6).
a)_ Os exageros do Princípio
Normativo
O Princípio Normativo tem
dado margem a invenções humanas no culto. Dentre as invenções, podemos
destacar:
·
Músicas antropocêntricas: São músicas que exaltam o homem.
·
Apresentações:
Muitos têm introduzido no culto a apresentação de solo de guitarra,
bateria, contrabaixo, danças, coreografias, teatros, stand up comedy,
apresentação de palhaços, luta livre, etc.
·
Cerimônias:
Muitas são as cerimônias introduzidas no culto: Cerimônia do lava pés,
batismo representativo (uma pessoa é batizada representando outra), pedobatismo
de roupas infantis (se a criança não pode vir ao batismo, batizam as roupas da
criança), santa ceia com troca de cálices, etc.
·
Efeitos especiais:
Muitas são as igrejas que aderiram aos efeitos especiais nos cultos: luzes
coloridas, gelo seco, fumaça, sons especiais, fundo musical na pregação, etc.
·
Ofertório apelativo: Em muitas igrejas, o momento das
ofertas é mais duradouro do que a pregação. São ofertas de todo tipo, sempre
com o propósito de sair no lucro.
·
Falta de ordem e decência: Em muitas igrejas encontramos rodopios,
risos, urros, línguas estranhas coletivas, etc.
Esses são alguns dos perigos do Princípio Normativo. Por isso existe
tamanha aversão a este modelo de culto.
3.2_ O Princípio Regulador
O Princípio Regulador do Culto faz oposição ao Princípio Normativo,
afirmando que: “O culto público deve ser bíblico. [...] Só é permitido no culto
aquilo que tiver real fundamentação bíblica.” – Paulo Anglada. (7).
Para os que defendem este
Princípio o culto que é agradável a Deus não pode ter invenções humanas e
mundanas. Deve ser pautado totalmente pelas Escrituras.
b)_ Os perigos do mau uso do
Princípio Regulador do Culto
Se por um lado contemplamos
os exageros naqueles que adotam o Princípio Normativo, por outro lado, existem
aqueles que confundem o que seja o Princípio Regulador do Culto.
Existem líderes de igrejas
que, no intuito de implantar o Princípio Regulador do Culto em suas
comunidades, criaram suas próprias regras.
·
Orações previamente escritas: Muitos exigem que as orações sejam
escritas num papel e, previamente, apresentadas ao líder para ver se estão de
conformidade com as Escrituras.
·
Salmos Metrificados: Há igrejas que proíbem qualquer cântico
no culto que vá além dos Salmos Metrificados. Há um controle exacerbado no
ritmo do hino para que não seja introduzidos ritmos diversos, considerados
mundanos.
·
Mensagens previamente escritas: É possível encontrar igrejas onde o
pregador apenas lê para a igreja uma mensagem previamente escrita. Se o pastor
da igreja não estiver presente, outro crente será indicado para ler a mensagem
previamente escrita, na íntegra, pelo pastor.
·
Ausência de instrumentos musicais. Muitas igrejas tentam abolir o uso de
instrumentos musicais. Para elas os instrumentos são elementos estranhos no
culto.
·
Abolição do ofertório: Ainda em nome do Princípio Regulador
do Culto, existem igrejas que querem acabar com o momento da oferta material.
·
Abolição do louvor solo: Muitas igrejas não permitem que alguém
cante um hino solo. Todo o louvor tem que ser congregacional e, tão somente, no
Livro dos Salmos.
Estas são algumas razões
porque as pessoas criaram aversão ao Princípio Regulador do Culto.
IV_ OS ELEMENTOS DO CULTO
PÚBLICO
Vamos considerar os elementos do culto. A fonte usada aqui consta na
Bibliografia do final da lição. (8)
a)_ As Sagradas Escrituras
A Bíblia é a Palavra de Deus.
Ela é o elemento mais importante do culto cristão.
A Bíblia deve aparecer em
todas as partes do culto:
·
Na leitura individual,
conjunta ou alternada.
·
No canto congregacional,
coral, conjuntos e solos.
·
Na pregação e exposição da
Palavra.
·
Nas saudações e bênçãos
pastorais.
b)_ A oração
A oração é indispensável ao
culto. A Bíblia nos ensina que a oração faz parte do culto particular e
público.
A oração deve ser praticada:
·
Individualmente;
·
Coletivamente.
As orações nas reuniões da
igreja devem ser uma constante hoje como foi no passado (At 1.14; 4.24; 12.5;
21.5; Lc 1.10; Mt 18.19).
c)_ A Música
A música também se destaca
como um elemento indispensável ao culto.
A igreja sempre usou hinos e
cânticos na expressão do seu culto (Rm 15.9; I Co 14.15; Ef 5.19; Cl 3.16; Tg
5.13; Ap 5.9; 14.3; Mt 26.30).
Alguns detalhes sobre a
música na igreja, apresentados pelo professor Bill Ichter, autoridade em
música:
·
Quanto a expressão: Deve expressar uma verdade bíblica.
·
Quanto à doutrina: Deve expressar doutrinas bíblicas.
·
Quanto à devoção: Deve ser caracteristicamente
devocional.
·
Quanto à forma: Deve possuir boa forma literária.
·
Quanto ao estilo: Deve ter um bom estilo musical.
·
Quanto à ocasião: Deve ser apropriada à ocasião em que
estiver sendo usada.
·
Quanto ao uso: Deve ser adaptada ao uso da
congregação.
·
Quanto ao alcance: Deve ser apropriada e ao alcance da
capacidade dos cantores.
A música na igreja é para
louvor a Deus, ficando descartada qualquer outra intenção.
d)_ As ordenanças
(sacramentos)
Há somente duas ordenanças
instituídas por Jesus e que são elementos do culto:
·
O batismo: Que é administrado somente uma vez para
a mesma pessoa.
·
A Santa Ceia: Que é administrado semanalmente ou
mensalmente.
Ambos são celebrados
publicamente e administrados por pastores ordenados e oficiais.
e)_ Ofertório
O ato de ofertar ou
contribuir (materialmente) faz parte do culto. O ofertar sempre foi um elemento
integrante da adoração a Deus e uma expressão de fidelidade (Dt 12.4-7; Ml
3.10; Mc 12.41-44; II Cr 8.12-18; Hb 13.16).
CONCLUSÃO
Diante do que vimos, algumas
coisas têm que ficar claras: a Bíblia deve ser a única fonte de orientação para
o culto. Sendo assim, ninguém pode inovar o culto introduzindo elementos
estranhos à adoração à Deus. Igualmente, ninguém pode criar normas próprias,
dizendo que estão nas Escrituras, quando não há nenhuma sustentação bíblica,
pois, de fato, pode “engessar” o culto.
Nosso culto não pode ser uma
reprodução da cultura nem uma tentativa de manipular Deus, mas deve ser
inteiramente norteado pelas Sagradas Escrituras que têm autoridade suficiente
para normatizar o culto.
Por fim, precisamos lembrar
que a nossa vida já é um culto à Deus. Entretanto, precisamos saber fazer
distinção entre o nosso culto pessoal (particular) e o culto público. O que
cabe em um pode não caber no outro. Por exemplo, no culto público ministramos a
Ceia do Senhor. No culto particular (pessoal) não vou ministrar a Ceia a mim
mesmo. No culto público tiramos oferta. No culto particular não cabe tirar
oferta. No meu culto pessoal posso saltar de alegria, dar cambalhotas me
regozijando diante do Senhor, mas isso não cabe no culto público. Muitos
elementos presentes no culto particular devem ficar no culto particular.
BIBLIOGRAFIA
(1)_ CALVINO, João. Apud ANGLADA, Paulo. O Princípio Regulador no Culto. São
Paulo: PES. S/D/. P13.
(2)_ CALVINO, João. Apud YOUNG, W. O Princípio
Puritano da Adoração. Jornal os Puritanos. Ano VIII, Nº 2, Abril/Maio/Junho
2000. Editora; Puritanos. P4.
(3)_ OWEN, John. Apud ANGLADA, Paulo. O
Princípio Regulador no Culto. São Paulo: PES. S/D/. P17.
(5)_ ALIANÇA CONGREGACIONAL, Confissão de Fé Congregacional. Recife:
Editora Aliança. 2014. P95.
(6)_ MURRAY, Ian. As Escrituras e As Questões Indiferentes.
Jornal os Puritanos. Ano VIII, Nº 2, Abril/Maio/Junho 2000. Editora; Puritanos.
P6
(7)_ ANGLADA, Paulo. O Princípio Regulador no Culto. São Paulo: PES. S/D/. P12.
(8)_ CASIMIRO, Arival
Dias. Os elementos do culto. Revista
Educação Cristã. Vol 01. Lição 04. Santa Barbara d´Oeste: Z3 Editora. 2013.
P15.